Como se conta algo a alguém que já nos foi muito próxima e agora mal falamos?
Sabem aquela pessoa a quem juramos amizade eterna? Que é a primeira pessoa a quem queremos contar tudo e mais alguma coisa? Com quem passamos horas e horas a conversar ao telefone? Ou que temos reuniões semanais para café sem sequer ser preciso marcar?
Eu tinha uma amiga assim. E o que eu gostava dela!
Nós conhecíamos-nos à muito tempo mas aproximamos-nos na escola básica. Tínhamos - e temos - cerca de 3 anos de diferença (eu mais velha e ela mais nova) mas um historial de vida e uma família muitíssimo diferentes. O que, mesmo não sendo falado e assumido, gerava alguma "rivalidade". Houve uma altura em que eu tinha a certeza que ela estava sempre em competição com qualquer pessoa que se aproximasse dela. Ela queria mostrar que conseguia fazer ou chegar a qualquer lado que os outros chegassem ou conseguissem. Muito, penso eu, por causa do seu complexo em ser mais gordinha e por vir de uma "família problemática".
No entanto, eu gostava genuinamente dela, por isso simplesmente ignorava esse comportamento. E, durante alguns anos, conseguimos manter a amizade.
Pelo menos até começarmos a seguir caminhos diferentes. A fazer novas amizades - que ela dificilmente aceitava. E a fazer escolhas diferentes das que tínhamos planeado durante divagações em cafés.
Lembro-me de ela ser bastante explicita quando eu lhe apresentei o M. No entender dela o meu ex é que era o tal. Não porque me fazia mais ou menos feliz mas sim porque era do nosso grupo de amigos e assim o grupo não precisava de se "desfazer". Houve outra altura em que convidei mais alguns amigos, que lhe queria apresentar, para o nosso café habitual e, quando ela chegou apenas disse "podias ter avisado que vinha mais gente" e foi para a outra ponta da mesa.
Situações como estas ditaram o nosso afastamento. E, embora eu continue a ter um carinho muito especial por ela, cada vez mais acho que as competições e as rivalidades foram difíceis de continuar a ignorar e acabaram por se tornar tóxicas para nós. Por isso cada vez penso menos nela como a pessoa a quem quero contar algo em primeiro lugar.
E aqui surge o meu dilema: Como lhe conto da gravidez?
Isto porque, embora ela não tenha sido a primeira pessoa a quem quisesse contar, queria mesmo ser eu a dizer-lhe - como gostava que assim fosse caso a situação fosse inversa - mas cada vez que pego no telemóvel para a convidar para mais um café que sei de antemão que ela vai recusar, perco a vontade. Tudo porque sei que a noticia vai tornar-se mais uma rivalidade e não no motivo de alegria e comemoração. Vai ser algo que ambas sempre quisemos e que eu alcancei primeiro. Vai ser um motivo para nos afastar ainda mais.