The Cherry

Por diversas vezes - mesmo antes de engravidar - vi e ouvi mulheres queixarem-se que os filhos ficavam sempre a cargo delas. É para mudar a fralda? A mãe muda. É para levar ao médico? A mãe leva. É para dar banho? A mãe dá. É para responder a alguma coisa? A mãe é que sabe. É para ajudar nas tarefas da escola? A mãe ajuda.

E de quem é a culpa que assim seja?, pensava eu.

A Leonor nasceu e, ainda estando eu na maternidade, o M começou a fazer parte da vida dela e das tarefas que isso acarretava. Sempre que estava na hora de trocar a fralda e o M estava presente, eu incentivava-o a trocar. Ela fazia xixi na roupinha e tinha que se trocada? "Força nisso, chega-te à frente!", dizia-lhe eu. E sempre foi - e será - assim. Ele até pode não saber tudo porque a herdeira passa mais tempo comigo mas eu faço questão que ele saiba tudo o que é possível.

Até ao dia em que ele foi com a herdeira fazer recados e eu vim para a loja:

- Então a menina? Está ai consigo? - perguntam-me as clientes

- Não, hoje está com o pai!

- Com o pai?!?! - perguntam quase horrorizadas

Até ao dia em que eu vou com a menina à médica de família para levar a vacina:

- Então como correu a consulta no pediatra?

- Correu bem. O pai é que foi com ela mas o Dr diz que ela está boa.

- Foi só o pai? A mãe não foi também?!

Até ao dia em que eu apareço sozinha na casa de um familiar:

- Vieste sozinha? A Leonor?

- A Leonor ficou com o pai.

- E deixaste-a sozinha com ele?!

Depois de a Leonor nascer fiquei com a nítida noção que as mães - as mesmas que se estão sempre a queixar - servem para tudo porque insistem que assim seja. As mulheres quase que se obrigam umas às outras - através de julgamentos - que assim seja. 

Por isso expliquem-me lá: afinal para que serve o pai?!

Desculpem-me a expressão mas o pai serve apenas para fazer o filho? Tipo dador de esperma ambulante?!

Eu tenho orgulho em dizer que a Leonor tem mais que uma procriador, tem um pai! 

Alguém me diz como se abranda o passar do tempo?

#2Meses 

3a feira, eram umas 8h da manhã, e estava eu a dar de mamar a herdeira.

Sem pedir nada o M aparece-me com o pequeno almoço na cama.

- Para quê? - perguntei eu já desconfiada.

O rapaz fez um olharzinho a gato das botas do Shrek e respondeu:

- Estás sempre a queixar-te que não tens tempo para comer...vim fazer-te um miminho.

Com isto até me fiquei a sentir mal  Ele só queria agradar e eu logo a pensar que haviam segundas intenções. "Estavas a ser má, Susana! Ele afinal só queria ser fofinho! ", pensei eu.

Nem 5 minutos depois, ainda eu nem tinha conseguido tocar no pequeno almoço, diz ele:

- Sabes o que dava mesmo mesmo jeito? É que depois da hora de almoço fosse comigo para passares no banco e ires pagar as contas da loja...

É preciso dizer mais alguma coisa? 

Para quem está a pensar " Se calhar foi coincidência " tenho a dizer que hoje é 5a feira e não houve mais pequenos almoços surpresa! 

Não sei. Não consigo 

Não sei se alguma vez disse em "voz alta" aqui no blog mas, por diversas vezes, disse ao M que eu iria criar índios. Muito antes das gravidez já o dizia e durante a gravidez voltei a afirma-lo diversas vezes. 

Eu tinha a certeza absoluta que iria ser uma mãe super descontraída! Cautelosa mas descontraída. 

E agora que a Leonor nasceu?A gora? Uí! 

Agora é ver aqui a menina a levantar-se a cada suspiro mais intenso, a cada gritinho ou a cada choro. É ver aqui a menina cheia de aplicações no telemóvel e páginas de internet abertas com pesquisas sobre bebés. É ver aqui a menina com listas e inúmeras perguntas para fazer a Dra a cada consulta.

Como é criar índios Cherry? 

Desde o primeiro segundo que eu tive a herdeira nos braços e percebi que aquela coisinha pequenina dependia dos meus cuidados que essa certeza - a única certeza que eu tinha sobre mim enquanto mãe - caiu redonda no chão. 

Como é possível um ser gerar tanta preocupação e tanto amor em simultâneo? 

Raios parta aos sentimentos!